Depois de acabar de vez com a cultura, fica o vazio. Ou talvez não. Portugal é um país sem política de cultura. O que não é necessariamente mau, se pensarmos que qualquer projeto programático tem sempre laivos de controlo e se há coisa a que a cultura deve, por natureza e missão, resistir é a ser instrumento do Estado. A história tem demonstrado que entre esta sensibilidade intelectual e a prática real há um abismo imenso. Não faltam os filhos do(s) regime(s) e a lógica distributiva das migalhas que os governos lançam abaixo da mesa da arte encontra sempre clientes habituais. Neste estado amorfo, surgiu a pandemia, que parecia vir para acabar de vez com a cultura. E, no entanto, ela move-se. Move-se nos processos de reinvenção de artistas suspensos, na depauperada, mas resiliente, programação dos subfinanciados museus nacionais, nos banhos de público da programação musical logo que foi possível o regresso dos espetáculos, na sede de cultura de um público que não desiste.
Apesar do lamento dos críticos, da crise real de financiamento do setor, é da essência mesma do gesto cultural e artístico resistir sempre. Todavia, reduzir o gesto artístico a resistência à adversidade do financiamento e do investimento é desde logo retirar-lhe a capacidade de ser estruturante para o desenvolvimento, e também o crescimento do país. Este setor alargado com um contributo de 4,5% para o PIB tem a singularidade de em conjunto cultivar a formação estética, essencial a uma participação cívica consistente, fomentar a criatividade e a inovação e promover o crescimento do país. Estas três dimensões exigem mecanismos de desenvolvimento diferenciados: uma estrutura de formação de base adequada, flexibilidade das organizações de apoio à cultura para acolhimento de iniciativas e práticas artísticas com natureza mais ou menos institucional, um conjunto diferenciado de mecanismos de financiamento, mas também de investimento, adequados ao setor e políticas de promoção - não de programação - consistentes.
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